RAIO-X DA EMPRESA
Tractebel - parte 2

Análise de Múltiplos

Alerta

Como sempre, alertamos que a Tabela de Dados é sujeita a todo tipo de distorção, com destaque para os efeitos da inflação e das variações cambiais. Aqui estamos mais interessados em tendências e ordens de grandeza do que números precisos. Para facilitar a comparação com o período anterior, usamos "dólares ajustados" para os anos a partir de 1999, fortemente impactados pela desvalorização. Não se deve atribuir importância excessiva à previsão de lucro para 2008, feita por computador.

Prejuízos não impediram forte progresso

A Tabela de Dados mostra um quadro de recuperação e forte progresso desde a privatização da empresa em 1998. No entanto, com prejuízos em 1999 e 2002, não é um histórico de crescimento de lucro sustentado.

O prejuízo de 1999 ocorreu logo após a privatização da empresa e se deve ao impacto da forte desvalorização do real sobre seu endividamento em moeda estrangeira.

A perda em 2002 foi fruto do racionamento. Como explica a empresa:

"O resultado foi substancialmente afetado pela redução do mercado de energia elétrica, cujas conseqüências na Tractebel se dão, principalmente, pelo fato de que não foi possível contratar toda a energia assegurada de seu parque gerador, sendo parte da energia vendida no Mercado Atacadista de Energia Elétrica – MAE, no período pós-racionamento. Essas vendas mantiveram patamar médio de R$ 10,00 por MWh, diferentemente do período do racionamento, quando o preço médio atingiu R$ 347,00 MWh.

Ainda como conseqüência da redução do mercado, destacam-se os termos do Acordo de Compra de Sobras Líquidas Contratuais, firmado sob a regência do Acordo Geral do Setor Elétrico, onde se definiu que as geradoras devem recomprar, até dezembro de 2002, por R$ 73,39 o MWh, a energia vendida nos Contratos Iniciais e não utilizada pelas distribuidoras, em virtude da retração do consumo. Este valor é superior aos preços de venda previstos nos Contratos Iniciais, da ordem de R$ 50,00, e de venda no MAE neste período, da ordem de R$ 10,00 o MWh."

Preferimos anos ininterruptos de lucro mas concluímos que os problemas de 1999 e 2002 não prejudicam seriamente o histórico da Tractebel porque foram causados por eventos de ocorrência rara.

Aumento de retorno alavanca nível de preço

Os prejuízos, junto com o quadro de recuperação, dificultam a comparação dos indicadores passados com os atuais. Em termos gerais observamos, ao longo dos 10 anos exibidos, que o grande aumento no retorno sobre patrimônio líquido e na margem líquida teve efeito alavancado sobre o indicador preço/patrimônio líquido. A tendência do preço/lucro é volátil até os últimos três anos quando se observe uma valorização gradual.

Mas a posição é menos impressionante que parece à primeira vista: os retornos altos se devem tanto ao aumento do lucro quanto a redução, ou estabilização, do patrimônio líquido. É uma situação que lembra a AES Tietê.

Não entendemos perfeitamente esse fenômeno, que deve ser resultado, ou de investimentos anuais abaixo da depreciação anual (ou baixas), ou do pagamento excessivo de dividendos, ou ambos. De fato, representando 87% do lucro líquido nos últimos 5 anos, em média, não há muita dúvida sobre a participação no processo da política generosa de dividendos.

Indicadores parecidos com a CPFL ...

A variação entre os indicadores individuais apresentados pelos membros do segmento de geração é de tal tamanho que não faz muito sentido comparar a Tractebel com as médias do grupo; é melhor fazer uma comparação mais direta.

Entre as empresas da iniciativa privada vimos que a Tractebel, embora mais rentável e com sua ação um pouquinho mais cara, possui indicadores parecidos com a CPFL Energia (uma empresa que não se limita à geração de energia).

.. Mas bem diferentes das estatais

Por outro lado, enquanto o retorno da Tractebel é o dobro da média das estatais Cemig e Copel, seu P/L é dois terços maior e seu preço/patrimônio líquido três vezes maior!

Porque as estrangeiras têm alto payout?

Finalmente temos os indicadores surpreendentes da AES Tietê, outra empresa do setor privado. Tanto a Tractebel quanto a AES Tietê são um desafio para qualquer análise de múltiplos. Como os patrimônios líquidos têm caído fortemente, ambas empresas apresentam altíssimos indicadores de retorno sobre patrimônio e preço/patrimônio líquido. Mas as duas também exibem gordas margens líquidas, indicadores livres de distorções.

Igualmente surpreendente, as duas empresas distribuem quase todos seus lucros líquidos como dividendos. Porque? Como as duas são controladas por empresas estrangeiras só podemos concluir que há um desejo de repatriar o máximo possível de fundos enquanto o real estiver valorizado.

Razões para preferir Tractebel

A Tractebel não se destaca claramente nas comparações mas, em cada caso, há razões para preferir a empresa: além de possuir um yield de dividendo maior que a CPFL Energia, o histórico de dados que possuímos para a Tractebel é bem mais longo que seu rival; preferimos a iniciativa privada ao risco apresentado pelo controle estatal presente na Copel e Cemig; e desconfiamos de uma empresa - a AES Tietê - que evita a expansão.

Vantagem sobre o mercado

Em relação ao mercado em geral, enquanto o retorno da Tractebel e seu yield de dividendo são o dobro da média, seu P/L é 11% menor e seu preço/patrimônio líquido é 1,8 vezes maior. Embora devamos levar em conta que tanto o retorno quanto o preço/patrimônio líquido da Tractebel provavelmente estão inflados, aqui a empresa parece apresentar uma clara vantagem.

Em conclusão: embora a empresa possua uma rentabilidade muito maior que na época de sua privatização não é possível afirmar que a ação da Tractebel exiba um desconto sobre níveis passados; por outro lado, o papel da empresa apresenta uma pequena vantagem sobre seus pares e uma boa vantagem sobre o mercado em geral.

Cálculo do Valor Intrínseco

Prevemos crescimento de lucro de 5%

Se incluirmos a queda de 2001, provocada pelo racionamento, o consumo de energia elétrica no Brasil desde 1998 tem se expandido a somente 2,5% aa. Nos últimos 5 anos a cifra tem sido 4,4% aa.

Desde 1998, a Tractebel tem aumentado sua capacidade instalada a uma taxa 5,2% aa. Por outro lado, no mesmo período a receita bruta da empresa, em termos reais, cresceu a 10,8% aa, turbinada pelo aumento de tarifas advindo da troca de "contratos iniciais" por "contratos bilaterais".

Como vimos na seção anterior, desde a privatização da empresa em 1998 houve prejuízos em 1999 e 2002. Se nos limitarmos ao período a partir de 2003 temos o lucro crescendo a por volta de 11% aa, em termos reais.

Não podemos considerar essa taxa como típica porque: i) o aumento de tarifas gerado pela troca de contratos "iniciais" por "bilaterais" acabou; e ii) não vai continuar indefinidamente os ganhos financeiros advindos do efeito da valorização do real sobre dívidas em moeda estrangeira.

Levando em conta os dados acima resolvemos adotar como premissa para o crescimento de lucro para os próximos 10 anos a taxa real de 5% aa. Essa porcentagem não é especialmente conservadora; simplesmente consideramos que a empresa conseguirá manter a expansão de capacidade apresentada nos últimos 9 anos e não sofrerá qualquer perda tarifária em termos reais. Análise das usinas em construção ou planejadas (ver a seção Planta) indica que há base física para a manutenção da taxa histórica por pelo menos 5 anos do período.

A partir do décimo primeiro ano supomos que o crescimento cai para 4% aa, um pouco abaixo da expansão de consumo de energia no Brasil nos últimos 5 anos.

Preço intrínseco de R$ 30,10

Para nosso lucro base adotamos o lucro de 2007 de R$ 1.046 MM. Em nossa análise dos Últimos Resultados chegamos à conclusão tentativa que esse lucro, impactado por diversos fatores, é conservador.

Na escolha da premissa de payout queremos compensar um pouco o risco embutido na taxa de crescimento acelerado. A Tractebel apresenta um payout médio de 87% para os últimos 5 anos. Como consideramos improvável a manutenção dessa cifra alta durante 10 anos vamos reduzí-la para 75%.

Mantemos nossa taxa de desconto de 8,5%, cerca de 1 pp abaixo da NTN-B de 10 anos.

O conjunto de premissas produz um preço intrínseco de R$ 30,10, 30% acima do preço de mercado de R$ 23,20. Se aumentarmos o payout para 80%, um cenário considerado ousado, a margem de segurança sobe para 38%.

Considerando as lacunas em nosso conhecimento da Tractebel e suas operações gostaríamos de ver uma margem de pelo menos 40%. Isso significa um preço de mercado máximo de R$ 21,50, um nível já atingido várias vezes em 2008. Assim, considerando o cenário realista, concluimos que, no preço atual, não há margem suficiente para tornar interessante uma compra do papel da Tractebel.

Premissas e Resultados



                                                A       B       
                                                                
                        Taxa de Desconto:      8,5%    8.5%     
                       Lucro Base (R$MM):      1046    1046     
             Taxa de Crescimento 10 anos:      5,0%    5,0%     
            Taxa de Crescimento Perpétua:      4,0%    4,0%     
                                  Payout:       75%     80%     
                                                                
      Valor de Mercado da Empresa (R$MM):     15144   15144     
      Valor Intrínseco da Empresa (R$MM):     19652   20962     
                        Preço Atual (R$):     23,20   23,20     
                   Preco Intrínseco (R$):     30,10   32,10     
                     Margem de Seguranca:       30%     38%     
                                Desconto:       23%     28%     
                                                                
               A = Cenário realista (payout = 75%)              
               B = Cenário ousado (payout = 80%)                
                                                                

Discussão

Como competir com yield de 10%?

Ao analisar o segmento de geração de energia é difícil ignorar o yield de dividendo excepcional oferecido pela AES Tietê. Vamos voltar à comparar a Tractebel com a AES Tietê usando outra fórmula derivada do Método de Fluxo de Caixa Descontado.

Adotando as médias do payout dos últimos 5 anos temos um yield de dividendo de 10,2% para a AES Tietê e de 6,5% para a Tractebel. Só que enquanto a AES mostra poucos sinais de crescimento, prevemos que a capacidade da Tractebel expandirá a 5% aa. É razoável supor que o crescimento dos dividendos da Tractebel acompanhará sua expansão física.

Como o retorno no investimento, se o yield se mantiver constante, é a soma do yield e da taxa de crescimento do dividendo (ou lucro) teremos retornos de 10,2% aa no caso da AES Tietê e 11,5% aa no caso da Tractebel. Assim vimos que o yield é somente metade da história.

Conclusões e Recomendação

Desde sua privatização em 1998 a Tractebel tem apresentado crescimento moderado de capacidade produtiva e boa expansão de receita. Embora lucro, retorno e margem líquido tenham atingido níveis excelentes nos últimos 4 anos houve percalços nos anos anteriores gerados pelo racionamento e pela desvalorizão cambial.

Adotando um conjunto de premissas relativamente conservadoras obtemos um preço intrínseco de R$ 30,10, 30% acima do preço de mercado. Dado às lacunas em nosso conhecimento da empresa achamos necessário uma margem de segurança de pelo menos 40% para tornar o papel da Tractebel atraente. Isso significa um preço de mercado máximo de R$ 21,50, abaixo, portanto, do preço de mercado atual.

Esse resultado, obtido usando o Método de Fluxo de Caixa Descontado, mostra convergência com a conclusão de nossa análise de múltiplos.

Embora a expansão de lucro prevista para a próxima década, de 5% aa em termos reais, seja relativamente modesta o retorno no investimento é turbinado por um alto yield de dividendo. Supondo a manutenção tanto desse yield quanto o payout dos últimos 5 anos podemos esperar um retorno real no investimento de por volta de 11,5% aa.

A Tractebel apresenta um nível razoável de risco: mudanças na regulamentação poderiam reduzir lucros; uma falta de chuva poderia desorganizar a produção; e uma queda no alto payout de dividendos poderia reduzir o retorno ao investidor.

Nota Importante: De acordo com nossa política de transparência, informamos que o responsável por Ação&Reação não mantém nenhuma posição nas ações da Tractebel.

Tractebel - parte 1

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Últimas notícias:

Revisão 1 (15/08/08): Neste dia o papel da Tractebel fechou em R$ 20,80, entrando, portanto, na faixa de compra recomendada na análise.

Revisão 2 (22/12/09): Trechos da notícia do CanalEnergia: "A Tractebel Energia vai pagar R$ 604 milhões pela Suez Energia Renovável S/A, que tem 40,07% de participação no Consórcio Estreito Energia na hidrelétrica de Estreito ...

De acordo com o presidente da Tractebel Energia, Manoel Zaroni, com esse preço, a empresa vai obter, no mínimo, uma taxa interna de retorno de 12% a 13%. 'O retorno do investimento calculado pelo Santander está entre 12% e 13% nominal em reais, sem considerar ganhos potenciais, tais como receita de energia secundária, os atrasos adicionais da entrada em operação da UHE Serra Quebrada e uso eficiente dos benefícios da Sudam' ...

O executivo também destacou que, como a operação da usina está prevista para fevereiro de 2011, um ano antes do cronograma, a energia poderá ser comercializada antecipadamente. 'O contrato é de 30 anos a partir de janeiro de 2012. Ou seja, ela vai entrar em fevereiro de 2011 e teremos um ano com energia livre para comercializar na Tractebel Energia', explicou ...

A UHE Estreito está localizada no rio Tocantins e terá 1.087 MW de capacidade instalada. Deste montante, 435 MW serão adicionados à capacidade instalada da Tractebel Energia ... O contrato de concessão da UHE Estreito tem período de 35 anos, assinado em dezembro de 2002. O contrato de concessão prevê a renovação por mais 20 anos."

Revisão 3 (11/12/09): Ao atualizar a estimativa do preço intrínseco mantemos o lucro base da análise que é praticamente igual ao lucro efetivo dos primeiros 9 meses de 2009, anualizado. Reduzimos a taxa de desconto para 7,1%, 0,4 pontos percentuais acima dos juros da NTN-B 2020 de 10 anos. Para sermos ainda mais conservadores baixamos a taxa de lucro acelerado de 5% para 4%. Com as mudanças obtemos um novo preço intrínseco de R$ 38,77, surpreendentes 76% acima do preço de mercado de R$ 22,00.

Por outro lado, a posição financeiro da empresa se deteriorou, com o indicador dívida líquida/patrimônio líquido do fim dos 9 meses de 2009 o dobro de seu valor do fim de 2007. Embora preferíssemos um nível menor, reconhecemos que o indicador não difere muito de outras empresas energéticas da iniciativa privada, ou da média de nossa base de dados. Quanto a liquidez corrente, seu nível de 30/12/09 mostra recuperação após uma queda preocupante no fim de 2008.

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