CHECK-UP DA EMPRESA |
Natura: perfume menos cheiroso
Código: NATU3 Data Base: 03/03/07 Preço da PN por 1000 ações: R$ 24,01 Número de ações: 427,51 MM Ibovespa: 42.369 Setor: Cosméticos, Fragrâncias e Higiene Pessoal Produtos/Serviços Principais: Cuidados com a Pele, Protetor Solar, Maquilagem, Perfumes, Fragrâncias, Cuidados para o Cabelo, Creme de Barbear e Desodorantes.
Mesma que a Natura tenha apresentado bom desempenho em 2006, uma queda inesperada em seu lucro no quarto trimestre ajudou a classificar sua ação entre os papéis que mais têm caído até agora em 2007. A explicação da redução do lucro ainda não foi totalmente esclarecida.
Adotando premissas conservadoras, estimamos um preço intrínseco para a ação da Natura de R$ 38,00, 57% acima do preço do mercado desta análise. Dado ao bom desconto, recomendamos a compra da ação em um horizonte de curto, médio ou longo prazo para uma carteira diversificada.
Um dos riscos do investimento é a reação imprevisível de outros investidores perante uma taxa de crescimento de lucro que é boa mas em provável desaceleração.
Introdução
Acidente de percurso ou desaceleração estrutural?
Em nosso Check-Up de 10/06, como um leitor atento observou, escrevemos:
"O risco oferecido pela ação no médio prazo é de uma queda de preço provocada por uma desaceleração acima da esperada no crescimento do lucro - ou por uma reação exagerada do mercado perante uma desaceleração moderada."
Mas mesmo que a reação do mercado não fosse totalmente inesperada, a queda de lucro da Natura no último trimestre de 2006 foi, pelo menos para nós, um grande surpresa. Fazemos votos que "a menor eficiência da estratégia mercadológica", o bode expiatório do episódio, seja mesmo um acidente de percurso - como inferiu a Natura - e não um sinal de desaceleração estrutural.
Perigo de investidores afoitos
Sempre apontamos, como empecilho para a elaboração de uma estimativa confiável do preço intrínseco da ação da empresa, o curto histórico de dados financeiros disponível. Agora com 12 anos de receitas brutas, 6 anos de balanços detalhados e 4 anos de indicadores de mercado, fica difícil manter essa posição.
Na verdade, o cálculo de um preço intrínseco mais confiável depende não somente de um longo histórico de dados mas também da consistência desses dados. E embora tenhamos uma série de receitas razoavelmente consistente não podemos dizer a mesma coisa em relação aos lucros.
A série mostra uma aparente recomposição do lucro da Natura, culminando com um patamar de margem líquida de 17%. Nesse provável nível máximo de lucratividade, a empresa conseguiu, em 2005, expandir seu lucro em 26%, em termos reais. Infelizmente, consideramos inviável a Natura manter a expansão neste nível.
Assim, o problema para o investidor conservador de longo prazo é conviver com a reação - difícil de prever - de investidores mais afoitos perante uma taxa de expansão de lucro em desaceleração.
Tabela de Dados
Ultimos Resultados
Ano de 2006
Canibalização
Em termos nominais, o lucro líquido da Natura cresceu 33,4% nos primeiros 9 meses de 2006, com relação ao mesmo período de 2005. Nos 12 meses, no entanto, o lucro subiu "somente" 16,1% sobre o ano anterior. De fato, lemos no Relatório Anual da empresa que o lucro líquido (consolidado) caiu 15,7% no último período do ano. Ficou claro que aconteceu alguma coisa estranha no quarto trimestre, tradicionalmente o mais forte do ano.
A explicação imediata está na área da receita. O crescimento da receita bruta consolidada, ano sobre ano, foi 21,4% nos primeiros 9 meses do ano, mas somente 16,6% no quarto trimestre. A empresa comenta que:
"No 4T06 a receita bruta consolidada (apresentou) crescimento de 16,6% em relação à do 4T05. No Brasil, a receita bruta cresceu 15,6% no mesmo período, taxa abaixo da nossa expectativa em função de uma menor eficiência da estratégia mercadológica de fim do ano, que apesar de conter diversos elementos inovadores, não atingiu os resultados planejados.
Desenvolvemos um conjunto de ações com o objetivo de aumentar a venda de nossos produtos
presenteáveis, o que de fato ocorreu, porém com uma canibalização de nossos demais itens, afetando a margem bruta da empresa."
Erro estratégico ou pressão da concorrência?
Estimamos que essa estratégia de "menor eficiência" custou à empresa e seus acionistas várias dezenas de milhões de reais. Aparentemente é um erro grosseiro, merecendo, talvez, a demissão do responsável. O incidente deixa uma marca de interrogação sobre a capacidade de setores da administração da empresa.
Por outro lado, lemos na Folha Online que: "A empresa atribui a redução (no lucro do quarto trimestre) ao aumento da concorrência no setor de cosméticos, além do prejuízo nas operações internacionais, com a abertura de novas subsidiárias." Isso sugere que fatores exógenos também tiveram influência sobre o desempenho desapontador da empresa em 2006.
Analisando as contas consolidadas do ano é fácil ver - em forma diluída, porque o problema foi concentrado no quarto trimestre - os detalhes numéricos da queda do lucro. Enquanto a receita bruta dos 12 meses cresceu 19,9%, o custo de vendas subiu 21,9%, despesas com vendas 22,6% e despesas gerais e administrativas 26,3%.
Em seu Relatório Anual a empresa também cita o impacto negativo sobre o resultado da menor receita financeira e do aumento na alíquota do imposto de renda. De fato, o peso desses dois itens sobre o resultado é mínimo.
Crescimento de produção física cai pela metade em 2006
Há a impressão que a empresa, em 2006, em termos de seus custos, se estruturou para um crescimento de receita bem maior que o verificado. Observamos, por exemplo, que a expansão da receita em 2006 foi, em termos reais, cerca de 5 pp menor que seu crescimento em cada um dos últimos 3 anos.
O desempenho da produção física confirma o quadro. O número de unidades produzidas cresceu somente 13,4% em 2006, metade do crescimento dos três anos anteriores.
Receitas na Argentina, Chile e Peru crescem 50% aa
Assim, as perguntas cruciais são as seguintes: a redução do crescimento da receita em 2006 foi mesmo fruto de um erro estratégico que já foi corrigido; ou a freagem é sinal de uma desaceleração estrutural de longo prazo? Há indício que a primeira explicação seja a mais provável: o crescimento de mais de 50% nas receitas obtidas na Argentina, Chile e Peru - que agora representam quase 10% da receita total da empresa.
No hipótese (otimista) dessa taxa de crescimento se manter, a receita dos três paises representará 20% da receita da Natura daqui três anos. E ainda há as operações incipientes no México, Venezuela e França.
Análise de Múltiplos
Alerta de sempre
Como sempre, alertamos que a Tabela de Dados é sujeita a todo tipo de distorção, com destaque para os efeitos da inflação e das variações cambiais. Aqui estamos mais interessados em tendências e ordens de grandeza do que números precisos. Para facilitar a comparação com o período anterior, usamos "dólares ajustados" para os anos a partir de 1999, fortemente impactados pela desvalorização.
Não se deve atribuir importância excessiva à previsão de lucro para 2007, feita por computador. Por razões de espaço exibimos somente 10 anos da Tabela, que vai de 1995 a 2007 (13 anos).
Patrimônio subvalorizado
Como já comentamos no passado, o fenomenal retorno sobre patrimônio líquido da empresa é conseqüência do fato de o denominador da relação estar atipicamente baixo. É fácil perceber isso porque o patrimônio líquido está sendo rapidamente recomposto, tendo subido de 7% da receita bruta em 2001 para 17% em 2006. O mesmo efeito é também responsável pelo altíssimo preço/patrimônio líquido. Em função desse processo prevemos que o declínio no retorno sobre patrimônio líquido, observado em 2006, continuará nos próximos anos.
P/L mais atraente
Não há nenhuma distorção - além da inerente de uma previsão - no preço/lucro atual de 18,2%. O P/L se encontra, após as fortes quedas dos últimos dias, abaixo dos valores do indicador no fim de cada um dos 4 anos anteriores. Isto é: a ação aparentemente oferece um desconto sobre seus níveis passados.
Comparando o indicador da Natura com o P/L médio de nossa base de dados, de 14,3x, observamos um prêmio de 27%. Não é excessivo considerando o desempenho excepcional da empresa.
Vale observar que a margem líquida já se mantem a 17% durante três anos. É sinal que a recomposição do lucro, observada na Tabela a partir de 2001, já se encerrou.
Finalmente, observamos que a empresa continua com caixa líquida - uma situação extremamente positiva.
Cálculo do Valor Intrínseco
Expansão de longo prazo de 8% ou de 20% aa?
A fim de rever as premissas usadas no cálculo do valor intrínseco, repetimos as estimativas do crescimento histórico da receita bruta consolidada - a única série longa de dados históricos à nossa disposição. Lembramos que, devido à reestruturação societária, a série não é totalmente homogênea.
Corrigindo as pontas da série, temos a receita bruta expandindo a 12% aa de 1995 a 2006. Mas a expansão não é estável ao longo do período: a taxa cresce a 8% aa na primeira metade e acelera para 20% na segunda. E em 2006 a taxa cai para 16,5%. Para efeito de comparação, o crescimento do lucro líquido da controladora foi de 20% aa em 2005, mas alcançou somente 14,8% em 2006. Todas as taxas são "reais".
Infelizmente, não sabemos se o crescimento rápido que se iniciou em 2003 representa um surto de duração limitada na trajetória da empresa, ou uma mudança estrutural de prazo maior? Por isso adotamos um cenário bem conservador.
Menor expansão + menor taxa de desconto + maior payout = ...
Supomos que o crescimento da receita na próxima década comece com uma taxa de 16% em 2007, um pouco abaixo do crescimento efetivo de 16,5% observado em 2006, e termine com uma taxa de 8%, equivalente à taxa entre 1995 e 2001. Assim temos uma taxa média de 12% aa.
Agora consideramos que a expansão de lucro, ao longo dos próximos 10 anos, segue a expansão da receita. A taxa de 12% aa é 1 pp abaixo da taxa usada em nossa última análise para o mesmo período. A partir do décimo primeiro ano mantemos a taxa perpétua de 5% aa.
Passando para o payout da Natura, verificamos, em uma provável mudança da política de dividendos da empresa, que o mesmo subiu de 43% em 2002 para 77% em 2006 (ver Tabela de Dados). Calculamos a média dos últimos 4 anos e ainda, por conservadorismo, deduzimos 5pp do resultado. Dá 65%.
Apesar do resultado de 2006 ser, aparentemente, afetado negativamente por um evento "não recorrente" - um erro de marketing - vamos de novo ser conservadores e simplesmente adotar, como lucro base, o próprio lucro efetivo do ano, de R$ 469MM.
Em função da forte queda das bolsas mundiais em curso a taxa de retorno de nosso título de referência - a NTN-B de 2015 - reverteu sua tendência de queda e está subindo, se encontrando neste momento em quase 7,8%. Para ter uma folga adotamos 8,5% como a taxa de desconto.
... Maior preço intrínseco!
Com essas premissas (Coluna A da Tabela abaixo) aplicamos o Método de Fluxo de Caixa Descontado (Dividendo), obtendo um preço intrínseco de R$ 37,60, 57% acima do preço de mercado na data dessa análise. É uma margem de segurança atraente. Se reduzirmos a taxa de crescimento acelerado para 11% (Coluna B da Tabela), o preço intrínseco cai para R$ 34,80, ainda 45% acima do preço de mercado.
O preço intrínseco de R$ 37,60 é um pouco maior que o preço de R$ 35,80 estimado em nossa última análise: as premissas de taxa de desconto menor e payout maior mais do que compensaram a previsão de crescimento menor.
Premissas e Resultados
Discussão
Improvável um preço intrínseco menor
Após a reavaliação da previsão de crescimento de lucro dos próximos 10 anos, temos mais confiança em nosso cálculo do preço intrínseco da Natura. É certo que temos pouca idéia da taxa efetiva do período por vir, mas é difícil imaginar taxas reais de crescimento significativamente abaixo da trajetória considerada.
Agora, o erro de "estratégia mercadológica" no quarto trimestre de 2006 introduz mais um componente de risco no estabelecimento de um valor para a ação. Acreditamos que nosso lucro base - que incorpora o resultado do erro - em parte reflete esse risco.
Riscos e recompensas da internacionalização
Há outra questão. Ao estabelecer as premissas estamos pensando essencialmente no mercado brasileiro. Mas a empresa está perseguindo um programa ambicioso de internacionalização que começará produzir efeitos importantes nos próximos anos.
Olhando o lado negativo, há o perigo dos custos desse programa impactar os resultados da empresa antes de aparecer os lucros. Olhando o lado positivo, há a possibilidade das novas operações gerarem nova onda de crescimento de lucro. Em outras palavras, a internacionalização tanto pode reduzir o crescimento previsto no médio prazo como acelerá-lo no longo prazo - ou até gerar os dois efeitos.
Conclusões e Recomendação
Parece que ainda não há consenso sobre o que provocou a menor expansão de lucro em 2006.
Por um lado a administração da Natura menciona, em seu Relatório Anual, um problema de estratégia mercadológica, que levanta questões sobre a competência de setores da administração da empresa.
Por outro, há comentários na imprensa, também atribuídos à empresa, que imputam o revés à intensificação da competição, assim gerando preocupação sobre a capacidade da empresa manter sua alta taxa de expansão de lucro.
De qualquer forma, a grande maioria das empresas estaria muito satisfeita ao ver seu lucro crescer 16,1% em um ano, em termos nominais, a cifra registrada pela Natura em 2006.
Adotando premissas consideradas conservadoras - que refletem, em parte, o impacto dos eventos de 2006 - estimamos um preço intrínseco para a ação da Natura de quase R$ 38,00, 57% acima do preço do mercado desta análise (ou um desconto de 36% no preço da ação).
Ainda há bastante incerteza sobre a taxa de crescimento de lucro na próxima década mas estamos razoavelmente confiantes que a provável trajectória de queda não será mais acentuada que a prevista em nossas premissas.
Como a grande margem de segurança identificada credencia a ação como um investimento atraente, recomendamos a compra da ação em um horizonte de curto, médio ou longo prazo para uma carteira diversificada.
Lembramos, no entanto, que um dos riscos de investimento na Natura é a reação imprevisível de investidores perante uma taxa de crescimento de lucro que é boa mas em provável desaceleração.
Nota Importante: De acordo com nossa política de transparência, informamos que o responsável por Ação&Reação mantém uma posição significativa nas ações da Natura.
Mande sua opinião!
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