CHECK-UP DA EMPRESA |
Bradesco: crescimento superior ficou para trás
Código: BBDC4 Ibovespa: 112879 Valorização em 2022: 10,9% Setor: Bancos
Deve ter havido um componente cíclico inibindo o crescimento do Bradesco na última década, mas análise de nossa base de 28 anos de dados do Bradesco também sugere fortemente desaceleração estrutural de longo prazo. A partir de 2019, após quase uma década de presença, o Bradesco e o Itaú Unibanco sumiram de vez de nossas listas das Empresas que Mais Crescem.
Mesmo reduzindo radicalmente nossas projeções de crescimento de lucro, o papel preferencial do Bradesco, após cair quase 30% desde dezembro de 2019, ainda apresenta modesto desconto. Mas não há margem de segurança suficiente para justificar uma compra.
Introdução
Sumiço das estrelas
Em 2010 o Bradesco e Itaú Unibanco foram as estrelas de nossa lista das Empresas que Mais Crescem na década anterior. Em anos subsequentes, no entanto, as taxas de crescimento de lucro dos dois bancos diminuíram progressivamente até, a partir de 2019, eles sumiram de vez do ranking.
O Check-Up atual, "Bradesco: crescimento superior ficou para trás" representa uma resposta tentativa à análise de 21/09/18 "Bradesco: desaceleração cíclica ou estrutural?". Parece que chegou a hora de reconhecer que os lideres do segmento privado do setor bancário tradicional nunca mais vão constar entre as Empresas que Mais Crescem.
Análise macro
Não somos especialistas no setor bancário mas, como Bradesco e Itaúsa (controladora do Itaú Unibanco), são membros importantes de nossa Carteira Concentrada de Buffet, sentimos na obrigação de analisá-los. Apesar de examinarmos as contas detalhadas do Bradesco, neste trabalho nos restringimos ao cálculo dos indicadores de investimento usados para empresas não financeiras. Por outro lado, damos grande importância à análise macro de tendências históricas, tirando proveito de nosso registro de 28 anos de dados.
Gráfico de Preço de 14 Anos
Tabela de Dados
Alerta
Alertamos que a Tabela de Dados acima é sujeita a todo tipo de distorção, com destaque para os efeitos da inflação, variações cambiais e alterações no regime contábil. Aqui estamos mais interessados em tendências e ordens de grandeza do que números precisos. Para facilitar a comparação com o período anterior, usamos "dólares ajustados" (explicados em nota abaixo da Tabela) para os anos a partir de 1999, fortemente impactados pela desvalorização.
Não se deve atribuir importância excessiva à previsão de lucro para 2022, feita parcialmente por computador.
Últimos Resultados
Ano de 2021
Os comentários se referem ao resumo dos resultados que aparecem na tabela mais abaixo.
Crescimento sem consistência
A grande parte do aumento de 19,8% nas Receitas de Intermediação em 2021 se deve ao valor negativo do Resultado com Instrumentos Financeiros Derivativos de 2020, um efeito classificaríamos como não recorrente.
Em relação às despesas, o fato das Despesas de Intermediação apresentarem aumento surpreendentemente modesto se deve à queda vertiginosa de 38,7% na Provisão para Créditos de Liquidação Duvidosa relativa a Operações de Crédito. De novo parece, para nós, um efeito não recorrente.
Note que não estamos sugerindo que o lucro de 2021 está necessariamente contaminado por efeitos não recorrentes mas que o crescimento do lucro do ano, sobre o resultado de 2020, possui pouca consistência.
Variações normais
Em vez de verdadeiros efeitos não recorrentes pode ser argumentado que os efeitos identificados são simplesmente variações normais das atividades bancárias. De qualquer forma, ao eliminar esses efeitos da comparação, que tanto aumentam receitas quanto diminuem despesas, o crescimento de 32,5% no Lucro Líquido desaparece. É uma lição na fragilidade dos lucros bancários!
Lucro recorrente adiciona R$ 4 BN!
De fato, a Análise Econômica e Financeira divulgada pelo Bradesco, ao apresentar o cálculo do "Lucro Recorrente" para 2021, lista uma série de eventos denominados não recorrentes que, em vez de diminuir o lucro, de fato aumenta-o em mais de R$ 4 BN! Entre os eventos citados temos:
- Realização/Reclassificação de Instrumentos Financeiros ("Inclui resultado da reclassificação de TVMs da carteira de "Disponíveis para Venda" para "Negociação", e giro no mercado de instrumentos financeiros")
Lucro do 4° trimestre cai 42%!
Os dados contábeis do quarto trimestre de 2021 mostram um lucro líquido que é 52% menor que o do terceiro trimestre, e 42% menor que o quarto trimestre de 2020. Imaginamos que fosse este resultado que, ao assustar investidores, disparou uma queda de 8% na ação do banco após a divulgação.
De novo, a Análise Econômica e Financeira do banco minimiza esse resultado, explicando que a maior parte do impacto dos eventos não recorrentes listados acima ocorreu no período em questão. Com sua exclusão o resultado do trimestre mais do que dobra!
Evolução dos Resultados Consolidados
Análise de Múltiplos
Os comentários se referem à Tabela de Análise mais abaixo.
Desconto de 25%?
O retorno sobre patrimônio líquido (RPL) do Bradesco, previsto para 2022, difere pouco da média do indicador dos últimos 12 anos. Assim, a comparação dos indicadores preço/patrimônio líquido (P/PL) e preço/lucro (P/L) atuais, com suas médias passadas, sugere que a ação do Bradesco está cerca de 25% abaixo do seu valor médio passado.
Com a semelhança entre retornos atuais e passados, não há clara evidência de ciclicidade. Com isso os indicadores ajustados não acrescentam muita coisa.
Risco bancário
A comparação entre os indicadores atuais do Bradesco e seu setor, com R/PL do banco um pouco menor, e P/PL e P/L um pouco maior, aponta a maior valorização da ação do Bradesco sobre seus pares.
No caso da comparação com o mercado, mesmo com o retorno do banco 27% menor, temos P/PL do banco mais baixo ainda. A comparação entre o setor e o mercado mostra uma situação semelhante, refletindo, provavelmente, o maior risco associado com o segmento bancário por investidores.
Desconto some!
Mas o Bradesco informa que seu lucro contábil de 2021, uma das bases para a projeção do lucro previsto, é impactado por efeitos não recorrentes. O lucro recorrente, após retirar esses efeitos, supera o lucro contábil em quase 20%.
Se adotarmos o RPL recorrente do banco, na comparação com a média de seus RPL´s passados, o desconto praticamente some. O problema, ao fazer isso, é ignorar prováveis efeitos não recorrentes nos resultados anteriores.
Mais uma vez batemos de cara com a pouca consistência de resultados bancários de anos individuais. A situação chama a atenção à importância de um longo registro de dados que tende a suavizar o impacto de efeitos não recorrentes.
Resumindo: o valor da ação do Bradesco atualmente se encontra bem mais baixo do que no passado, um pouco mais caro que a média atual de seu setor e, embora perca para o mercado em retorno, apresenta indicadores bem mais baratos como reflexo, provavelmente, de maior risco percebido por investidores.
Tabela de Análise: Descontos/Prêmios
Cálculo do Valor Intrínseco
Forte desaceleração
Ao longo dos últimos 12 anos - nosso ciclo teórico - o lucro anual do Bradesco praticamente não aumentou em termos reais. Nos 12 anos anteriores, no entanto, houve crescimento médio anual de mais de 15%. Embora não tão acentuado o Itaú Unibanco mostra comportamento semelhante. É evidência da forte desaceleração na expansão do lucro nas últimas décadas.
Ciclicidade x mudança estrutural
Mas não fica clara a divisão da responsabilidade entre ciclicidade rotineira e mudança estrutural. Certamente, os retornos dos últimos 6 anos, período de fraca atividade econômica, são inferiores aos retornos dos 6 anos anteriores, sugerindo desempenho cíclico. Por outro lado, com os bancos físicos enfrentando forte competição dos fintecs - seus rivais virtuais - nos últimos anos, uma queda permanente no ritmo de crescimento não surpreenderia.
Aqui é interessante observar que os bancos tradicionais, em vez de valorizar sua vantagem de contatos físicos vêm fechando agências e dificultando acesso. Assim, eles perdem duas vezes!
Crescimento futuro revisto
No horizonte de uma década, mesmo com baixo crescimento da economia nos anos iniciais do período, o Bradesco pode até se beneficiar das taxas maiores de inflação e juros. E com a redução da hospitalização causada pelo Covid, a controlada Bradesco Saúde deve apresentar taxa menor de sinistralidade.
Mas, mesmo prevendo alguma recuperação cíclica ao longo dos próximos 10 anos, é difícil imaginar o banco registrando expansão de lucro muito acima de 3% aa, em termos reais. Isso contrasta com a taxa "acelerada" de 5% aa adotada no Check-Up de 21/09/18 para estimar o preço intrínseco da ação do Bradesco.
Revemos também a previsão de crescimento "perpétuo". Consideramos pouco provável uma aceleração nas atividades no longo termo. A partir do décimo primeiro ano preferimos, em lugar da taxa de 3% aa adotada na análise anterior, a taxa real de 2% aa.
Lucros base!
Como premissa de lucro base, ao empregar o Fluxo de Caixa Descontado para estimar o valor intrínseco da ação do Bradesco, vimos três alternativas: o lucro contábil de 2021 de R$ 21.946 MM, o lucro recorrente de 2021 de R$ 26.215, e o lucro obtido ao multiplicar o retorno médio dos últimos 12 anos pelo patrimônio líquido do fim de 2021, de R$ 24.422 MM. Como os três têm suas vantagens e desvantagens resolvemos adotar a média, de R$ 24.194, ou R$ 2,50/ação. Convertemos o lucro base em dividendo base usando o payout de 35%.
Para analisar o efeito sobre o preço intrÍnseco do uso desse dividendo base com diversas taxas de crescimento simulamos múltiplos cenários na Análise de Sensibilidade abaixo.
A Análise mostra que para obter uma margem de segurança que torna ao papel do Bradesco atraente precisamos, com preço de mercado de R$ 21,31, um preço intrínseco de pelo menos R$ 29,00. Infelizmente, consideramos a combinação de taxas de crescimento para obter este valor demasiadamente otimista.
Análise de Sensibilidade - Preços Intrínsecos (R$)
Margem de segurança de 20%
Adotando, como premissas mais realistas, crescimento de lucro de 10 anos de 3%, seguido por crescimento perpétuo de 2%, obtemos um preço intrínseco de R$ 24,10, representando margem de segurança de 13%.
Tabela de Premissas e Resultados
Discussão
Desconto insuficiente
Tanto a Análise de Múltiplos quanto o Cálculo do Valor Intrínseco parecem apontar na mesma direção: embora a ação do Bradesco apresente um desconto é insuficiente para justificar sua compra.
Premissas precárias
O trabalho chama a atenção às dificuldades em analisar bancos, especialmente num ambiente de grandes variações nas taxas de câmbio, inflação e juros. Além dos eventos não recorrentes citados pelo Bradesco, vimos grandes variações no nível de provisões e nos resultados de operações com derivativos. Essas variações tornam premissas de análise bastante precárias. Dá para entender porque o mercado tende a subvalorizar papeis bancários.
Resultado valorizado
É notável que os eventos não recorrentes enumerados pelo Bradesco acabam inflacionando o resultado do banco. É certo que os Relatórios de Administração das empresas tendem a enfatizar os aspectos positivos de seu desempenho e minimizar suas deficiências, mas temos a impressão que as comunicações do Bradesco se destacam nesse sentido.
Conclusões e Recomendação
Deve ter havido um componente cíclico inibindo o crescimento do Bradesco na última década, mas análise de nossa base de 28 anos de dados do Bradesco também sugere fortemente desaceleração estrutural de longo prazo. A partir de 2019, após quase uma década de presença, o Bradesco e o Itaú Unibanco sumiram de vez de nossas listas das Empresas que Mais Crescem.
Mesmo reduzindo radicalmente nossas projeções de crescimento de lucro, o papel preferencial do Bradesco, após cair quase 30% desde dezembro de 2019, ainda apresenta modesto desconto. Mas não há margem de segurança suficiente para justificar uma compra.
Nota Importante: De acordo com nossa política de transparência, informamos que o responsável por Ação&Reação detém uma posição das ações do Bradesco.
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